39 - Pesadelo

 

 

Eu disse a Renata que tinha muito dever de casa para fazer e não queria jantar. Mentira que se ela me conhecesse bem, saberia que eu nunca perderia um jantar para fazer tarefa de aula. Mas ela aceitou aquilo numa boa, ficando até feliz com a dedicação do seu "filhinho". Pelo menos hoje eu não me importava com os apelidinhos dela.

Alguma coisa rodava em minha cabeça. Algo muito irreal. Estranho, na verdade. Comecei a bloquear os pensamentos. Me joguei na minha cama colocando o travesseiro em minha cabeça, fechei os olhos com força e lutei para não pensar... Até que, finalmente, dormi.

Abri os olhos para um lugar familiar. Reconheci a luz verde da floresta. Eu podia ouvir as ondas quebrando nas pedras em algum lugar por perto. Sabia que se achasse o mar, poderia ver o sol. Tentava seguir o som, mas então, Julia Galibi estava ali, e ela me puxava para a parte mais escura da floresta.

"Julia? Qual é o seu problema?", perguntei. O rosto dela estava assustado, enquanto ela me puxava com força e eu resistia. Eu não queria ir para a escuridão.

"Corre, Edu, você tem que correr!", sussurrou ela, apavorada.

"Por quê?", perguntei, ainda tentando me libertar de Julia. Eu queria ir para o sol.

Mas Julia soltou minha mãe e gritou, tremendo de repente, caindo no chão escuro da floresta. Ela se contorceu no chão, me olhando com pavor. Fiquei sem reação.

"Julia?", gritei. Mas ela se fora. No lugar dela havia um lobo grande e castanho-avermelhado de olhos negros. O lobo desviou sua atenção de mim e apontou com o focinho para frente, seu pelo eriçado nos ombros, grunhindo baixo por entre as presas à mostra.

Notei uma luz que vinha da praia na minha direção.

E depois Clara saiu das árvores, a pele brilhando um pouco, os olhos verdes escuros e perigosos. Ergueu uma das mãos e acenou para que eu fosse com ela. O lobo ao meu lado grunhiu.

Dei um passo à frente, para Clara. Ela sorriu e seus dentes eram afiados e pontudos.

"Confie em mim", sussurrou ela.

Dei outro passo.

O lobo se atirou no espaço entre mim e ela, as presas mirando a jugular dele.

"Não!", gritei, erguendo-me estabanado da cama.

Respirei com força, enquanto os efeitos do pesadelo se dispersavam. Mas era difícil esquecer Clara daquela forma. Olhei no relógio e era cinco e meia. Eu ainda estava completamente vestido, mas me levantei. Não conseguiria dormir mais de qualquer jeito, agora não dava mais para evitar os pensamentos. Tudo rodava na minha cabeça. A história de Julia, o rosto de Clara, ela me salvando da van, minha mãe falando da serra. As coisas começavam a fazer um certo sentido - se você fosse louco!

Decidido, levantei e liguei meu computador. Fui na cozinha pegar algo para comer enquanto a máquina despertava. Quando voltei com uma tigela de cereal, abri a página de pesquisa na internet e digitei apenas uma palavra.

Vampiro.

Entrei logo no primeiro resultado. Falava sobre beber sangue humano, não poder andar no sol, virar morcego e morrer com estaca no peito. Todas essas baboseiras de filme.

O segundo site era o vampiro.com.br, segundo ele, falava novamente sobre o sangue, sobre cabelos, unhas, beleza (isso até que combina com a Clara!) e falava sobre gravidez entre vampiros e humanos, apenas vampiros masculinos e mulheres humanas (ótimo, eu não queria ter filhos mesmo). Mas nada que garantisse que Clara não me mataria, ao contrário, falava apenas do desejo que eles têm por sangue que chega a ser seu maior instinto. Fala da visão e audição aguçada.

Eu ainda não tinha minhas respostas.

Falava de alguns filmes e livros sobre o assunto, mas nada ainda poderia me garantir que Clara não me mataria. Ou que ela era de fato um vampiro.

Quase nada se identificava com a história de Julia e minhas observações. Fiz ma lista do que achava que era: velocidade, força, beleza, pele clara, olhos que mudam de cor; meus critérios. E os de Julia: bebedores de sangue, inimigos do lobisomem, pele fria e imortal.

Mas tinha outro problema, eles não podiam sair a luz do sol. Era o que eu mais entendia dos vampiros, tomam sangue e dormem durante o dia.

Irritado desliguei o computador. Aquilo era ridículo. Joinville estava me deixando louco!

Passei o resto do dia jogando no playstation para não ter que pensar em mais nada.