17 - Por que você veio para cá?
Seus olhos dourados-escuros me confundiam e respondi sem pensar.
- Meu pai se casou de novo. – eu disse.
- Isso não parece tão complexo. – discordou ela, mas de repente ficou simpática. – Quando foi que aconteceu?
Ah, demais, era tudo que eu queria, agora ia parecer uma garotinha trocando confidencias com ela. Ah, Eduardo, que decadência. O que diriam seus amigos?
- Em setembro. – minha voz saiu um pouco dura.
- E você não gosta dela. – supôs Clara, o tom de voz incrivelmente gentil me irritava.
- Não, Solange é legal. Filhos demais talvez, mas é legal.
- Por que não ficou com eles?
Eu notei o interesse dela, pois Clara continuava a me fitar com olhos penetrantes, como se a história insípida de minha vida fosse algo de importância crucial. Claro, ela se importa comigo, está morrendo de amores. Eu sou muito gostoso.
- Solange tem três filhos.
- E seu pai te mandou para cá para poder cuidar dos outros três. Seria difícil sustentar tanta gente. – ela supôs novamente, não era uma pergunta.
Meu queixo se elevou um pouquinho.
- Não, ele não me mandou para cá. Eu quis vir.
As sobrancelhas dela se uniram.
- Não entendo – admitiu ela, e parecia desnecessariamente frustrada com este fato.
Ai droga! Teria que ficar explicando para ela minha vida.
Vai Eduardo, continua assim e vai acabar o melhor amigo dela ao invés de conseguir dar uns pegas nessa deusa.
- Eu não agüentei aquelas crianças dominando minha casa. Antes era apenas eu e meu pai, entende. E então foi a dominação dos monstrinhos. Mexendo nas minhas coisas e gritando pela casa. Bom... um pesadelo. E eu decidi passar um tempo com minha mãe. – minha voz estava mal-humorada quando terminei.
- Mas agora é você quem está infeliz. – assinalou ela, num sussurro, como se temesse me irritar.
- Capaz. Eu posso muito bem sobreviver. Se quiser me consolar. – usei meu tom mais charmoso.
Ela virou a cabeça para trás e soltou uma sonora gargalhada, tão linda que quase me hipnotizou. Eu dei um sorriso junto com ela, incapaz de falar algo.
Depois olhei para minha carteira, a ideia de morar com minha mãe, ter deixado para trás o Rio, a praia, o calor, as gatinhas, meus amigos... tudo isso me deixava infeliz. Há anos Renata não estava presente em minha vida, não era uma relação comum entre mãe e filho.
Ela passou a me olhar como quem avaliava.
- Esta fazendo um belo papel. – disse devagar – Mas aposto que está sofrendo mais do que deixa transparecer.
Dei um sorriso dura para ela, odiando o rumo que essa conversa estava nos levando. Decididamente, seria a primeira vez que eu não sentia vontade de olhar para ela, e desviei meus olhos.
- Estou errada?
Resolvi não responder, dignamente estufei o peito e fiquei observando com excessiva atenção uma dupla ao lado.
- Acho que não. – murmurou ela, presunçosa.
- Por que isso interessa a você? – encarei seus olhos, minha vez de achar que podia adivinhar, ela estava a fim, ponto.
- Boa pergunta. – ela murmurou, pensativa. Desconfiei que falava consigo mesma. E após seu longo silencio, soube que era a única resposta que teria.
Perfeito. Apaixonada mais ainda não notou. Talvez negue seus sentimentos, o tipo de garota que tenta fugir. Humm, quem sabe. Erick me disse que ela não namora. Eu iria quebrar com essa convicção.