7 - Um golpe em seu ego

 

 

Enquanto ele olhava para ver do que eu estava falando – embora já soubesse, provavelmente pelo meu tom de voz -, de repente a garota com os cabelos cor de bronze olhou para ele. Ela olhou para meu vizinho só por uma fração de segundo, e depois seus olhos verdes fulguraram para mim.


Ela desviou os olhos rapidamente, para descontentamento meu. A garota era uma gata. Tive que admitir que mesmo naquele breve olhar, seu rosto não revelou nenhum interesse.


Meu vizinho riu sem graça, olhando para mim.


- São Clara e Edvandro Buzzi, e Etelvina e Joaquim Girardi. A que saiu é Elidia Buzzi. Todos moram com o Dr. Buzzi e a esposa. – ele disse a meia-voz.


Olhei para o lado para a garota bonita, que agora fitava a própria bandeja, desfazendo um pãozinho em pedaços com os dedos pálidos e longos. Sua boca se movia muito rapidamente, os lábios perfeito mal se abrindo. Os outros três ainda pareciam distantes e, no entanto, eu sentia que ela estava falando em voz baixa com eles.


Nomes estranhos e incomuns, pensei. O tipo de nomes que tem os avós. Talvez seja moda aqui, coisa de cidade pequena? Mas Erick era bastante normal.


- Eles são... muito bonitos. – tive que admitir. Até os meninos eram perfeitos.


- É. – concordou Erick com uma risada. – Mas todos estão juntos... Edvandro e Etelvina, e Joaquim e Elidia, quero dizer. E eles moram juntos. – sua voz era um deleite para a patente inveja com aquela situação. Tive que admitir que também sentia uma ponta de inveja –as garotas eram espetaculares.


- Quem são os Buzzi? – perguntei. – Eles não parecem parentes...


- Ah, e não são. O Dr. Buzzi é bem novo, tem uns vinte e tantos ou trinta e poucos anos. Todos foram adotados. Os Girardi são mesmo irmãos, gêmeos... os louros... e são filhos adotivos.


Durante a conversa eu não parava de olhar para a estranha família. Eles continuavam a olhar para as paredes e não comiam.


- Hmm, legal. – comentei. – Eles sempre moraram aqui? – perguntei.


- Não. Chegaram a uns dois anos de algum lugar mais ao sul.


Senti pena, eles também eram novos por aqui. Quem sabe eu não fizesse amizade com eles? Talvez uma das gatinhas esteja disponível para mim.


Enquanto pensava nisso, a mais nova, uma Buzzi, virou-se e encontrou meu olhar, desta vez com uma expressão de evidente curiosidade. Quando ela desviou a atenção, me pareceu que o olhar dela trazia uma espécie de expectativa frustrada.


- Quem é a garota do cabelo ruivo? – perguntei. Olhei novamente para ela, mas não me encarava mais.


- É a Clara. É linda, é claro, mas não perca seu tempo. Ela não namora. Ao que parece nenhum dos rapazes daqui é bonito o suficiente para ela. – comentou, num caso claro de dor-de-cotovelo.


Eu me perguntei se ela abriria exceções para os que acabaram de chegar. Quem sabe não tenho uma chance?


Mordi o lábio para esconder meu riso. Depois olhei para ela de novo. Seu rosto estava virado para o outro lado, mas achei que sua bochecha parecia erguida, como se ela também estivesse sorrindo.


Depois de mais alguns minutos, os quatro saíram juntos da mesa. Todos eram muito elegantes – até o grandalhão de cabelo castanho. Era perturbador de ver. A garota chamada Clara não voltou a olhar para mim.


Fiquei sentado a mesa com Erick e seus amigos por muito tempo, como fazia na minha antiga escola. Não tinha pressa para voltar a sala de aula. Segui com Erick para a quadra, ele nos avisou que era Educação Física.


Quando chegamos a sala, Erick já foi se encontrar com uma roda de alunos, do tipo CDF. Olhei ao redor enquanto caminhava de encontro ao professor quando notei alguém encostada na parede. Reconheci Clara Buzzi por seu cabelo e rosto perfeitos, encostada como uma deusa, completamente só próxima ao muro.


Enquanto caminhava para o professor, olhei-a furtivamente. Assim que passei ela ficou rígida, me olhando em alerta, tinha no rosto uma expressão estranhíssima – parecia com ódio. Aquilo foi um golpe fatal para meu ego.


O professor assinou meu papel e mandou eu me sentar para explicar novas regras. Me voltei para as cadeiras organizadas e notei que já estavam ocupadas. Os garotos esportistas eram os primeiros, se achando os gostosões, não via a hora de provar a eles que também era bom.


Caminhei para o único lugar vago, exatamente ao lado da belíssima Clara. Lancei olhares furtivos para ela, esperando pela retribuição. Mas Clara me olhava com nojo, parecendo até com ódio. Fechei a cara com aquela atitude. Qual é, eu nem estava fedendo. Não tinha jogado ainda para ela fazer aquela cara.


Garota estranha.


Ela ficou rígida. Parada tão perfeitamente ao meu lado que parecia nem respirar. Poderia jurar que era uma estátua ao meu lado. O professor falava sobre o tênis, explicando as regras e debatendo com os alunos que prestavam a atenção.


Teria até participado se não estivesse completamente curioso em relação aquela criatura ao meu lado. Clara parecia me odiar. Como poderia me odiar se nem me conhecia?


Olhei para ela novamente e ela me olhou com ódio, estilo olhar matador. Senti um arrepio. Aquela garota parecia muito má. Não me importei, as malvadas são mais interessantes.


Quando o sinal tocou, notei que Clara já estava caminhando pelo meio da quadra, indo embora. E havia sumido de vista mais rápido do que eu poderia pensar.


 Fiquei parado olhando com raiva para o local que ela havia sumido. Era tão mesquinha. Isso era injusto. Um gostosão como eu não poderia ser desprezado dessa forma.