24 - Não há nada de errado com a minha cabeça!

 

 

- Mas acho que você terá que ficar conosco por mais um tempinho. – ele disse para Adriani, que parecia sem ar ao ver o médico.

Aproximei-me de Clara.

- Posso conversar com você? – sibilei baixinho.

Ela recuou um passo, me olhando com irritação.

- Sua mãe está te esperando. – disse com rispidez.

- Gostaria de lhe falar. A sós. – pressionei.

Ela me olhou com raiva. Me deu as costas e saiu da sala. Quase corri para acompanhá-la. No corredor ela se voltou para mim.

- O que quer? – perguntou, irritada. Os olhos frios.

A animosidade dela apenas me irritou.

- Você me deve uma explicação. – retruquei, tão irritado quanto ela.

- Eu salvei a sua vida... não lhe devo nada. – havia ressentimento na voz dela.

- Já está arrependida? Por que então não me deixou ser esmagado pela vã?

Ela parecia espantada.

- Não me arrendo de nada. Eu apenas te puxei. Que mal a nisso? – me olhou desafiadora.

- A muito mal nisso, por que você não estava perto de mim quando a vã veio em minha direção! – bufei.

- Você bateu com a cabeça Eduardo. Não sabe do que está falando. – o tom de voz dela era cortante.

- Não há nada de errado com a minha cabeça!

Encarei ela, exigente. Clara sustentou meu olhar.

- O que quer de mim?

- Quero a verdade. – eu disse. – Quero saber por que estou mentindo por você.

- O que você acha que aconteceu? – ela rebateu.

- Você não estava perto de mim... E mesmo que tivesse aquela vã iria amassar nós dois. E não aconteceu, e suas mãos pareceram amassar a lateral da vã... e você deixou um amassado no outro carro e nem está machucada... e a van ia esmagar minha perna e você a levantou... – comecei a me sentir maluco. Senti-me irritado com aquilo. Mas era o que tinha visto.

- Acha que eu levantei a van? – seu tom questionava minha sanidade.

Concordei, sentindo tanto ódio que meu corpo tremia.

- Sabe que ninguém vai acreditar nisso. – disse ela com desdém.

- Não vou contar a ninguém. – até eu me achava louco.

A surpresa passou pelo rosto dela.

- Então por que se importa?

- Por que sim.

- Não pode simplesmente me agradecer a acabar com isso?

- Não. Obrigado.

- Não vai esquecer essa história, não é?

- Não. – fui firme.

- Espero que goste da decepção...

Trocamos um olhar zangado em silêncio.

- Por que você não admite as coisas Clara? Por que fica me evitando quando claramente me quer e por que não me conta o que realmente aconteceu? – desafiei. Estava irritado com aquela garota.

Ela riu.

- Acha que estou apaixonada por você Eduardo Souza? – seu tom era irônico. – Você que não passa de um machista que se acha para todas as garotas? Nunca que eu cometeria tamanha burrice. – a rispidez na voz dela me magoou.

Eu estava quase certo que sua hostilidade era amor reprimido, mas agora me sentia aleijado com suas palavras.

- Então por que se deu ao trabalho? – perguntei friamente.

Ela me encarou com o rosto pasmo e vulnerável.

- Não sei. – sussurrou. Um pouco atordoada.

E depois ela me deu as costas e se afastou.

Eu estava tão abalado que precisei de alguns minutos para poder me mexer. Ela não me queria, me chamou de machista... Tentando não pensar nisso segui para a saída no final do corredor.

A sala de espera estava cheia. Parecia que cada rosto da escola estava lá me encarando. Renata correu para mim, o rosto manchado pelas lágrimas, eu levantei as mãos.

- Não há nada de errado comigo. – garanti a ela, carrancudo, tirando meu ego que parecia seriamente machucado.

Ela me abraçou, graças a uma entidade divina, sussurrando.

- Ah, meu bebê, o que o médico disse?

- Não me chama de bebê. – retruquei com acidez. – O Dr. Buzzi disse que estou ótimo. – me irritei com aquele nome, qualquer menção aos Buzzi me irritava. – Vamos embora. – pedi irritado.

Renata me abraçou e me levou para fora, garantindo aos demais que eu estava bem, enquanto eu olhava para o meu tênis, sentindo vontade de chutar algo – quem sabe o poodle rosa de minha mãe quando chegasse em casa.

Minha mãe ficou tagarelando durante o caminho inteiro. Eu não lhe dei atenção, tentei não pensar em Clara, mas o modo como chegou tão rápido, a marca de seus ombros no carro e sua rejeição era difícil esquecer.

- Você vai precisar ligar ao seu pai. – Renata contou quando estacionou em casa.

- Contou a ele.

- Claro.

 Devia ter imaginado que ela faria isso. Liguei para o meu pai assim que entrei, me perguntou como estava e o que realmente tinha acontecido. Contei que por sorte tinha escapado ileso, e não falei sobre Clara, era vergonhoso admitir que uma garota me salvara. Ainda mais aquela garota. Meu pai me perguntou se eu não queria voltar para casa, e foi fácil para mim recusar, muito mais fácil do que imaginei.