4 - De sol a chuva

 

 

O Maestro é a escola pública estadual, mais próxima de minha casa – somente escolas estaduais têm ensino médio. E é para lá que devo me dirigir no dia seguinte. Acho que não vai ser tão horrível, sou bom em me enturmar. Não tenho dificuldades.

 

Eu seria a novidade, o filho de Renata que veio do Rio, talvez um grande atrativo para as gatinhas, poderia tirar proveito disso. Tenho um corpo malhado e bronzeado – apesar de que em poucos meses sem sol esse bronzeado suma completamente. Tenho a pele levemente dourada no seu natural, e um ar pálido, até doentio. O sol me dava uma excelente camuflagem, agora não haveria mais ele.

 

Quando terminei de, literalmente, jogar minha roupa no armário, peguei minha toalha de banho, roupas limpas e fui ao banheiro. Era de frente para o meu quarto e a porta estava aberta, foi fácil de achá-lo. Tomei um banho rápido e enrolei a toalha na minha cintura. Parei na frente do espelho para arrumar meu cabelo. Eles são negros, um pouco ondulados e meus olhos são pretos também, mas sou bonito. Tenho um sorriso perfeito, apesar de manter o ar sério, tipo indiferente, para deixar as garotas mais caídas por mim.

 

Pisquei para minha imagem no espelho.

 

Dormi muito pouco aquela noite. Após o jantar resolvi inaugurar meu novo computador, checar se a internet estava funcionando e aproveitei para falar com meus amigos – agora distantes – pelo Orkut. Ao fundo era audível a chuva caindo. Ouvi a coisa horrorosa latir. Se aquela coisa latisse durante a noite eu não resistiria em dar-lhe um pontapé.

 

Só o que se via pela janela eram as nuvens densas e cinzentas que escondiam o maravilhoso sol. Não tinha certeza de que me acostumaria com a chuva.

 

O café da manhã com minha mãe foi um pesadelo. Ela me beijou no rosto e ficou falando animadamente sobre a escola, se ofereceu desesperadamente para me dar uma carona até lá, mas eu recusei com veemência – já imaginou ela me beijando de despedida?

 

Ela foi derrotada e me explicou o caminho para a escola. Era simples, caminhar até a rua principal e depois ir toda vida reto até o final do mundo para chegar na escola. Ótimo, seriam dois quilômetros de caminhada.

 

Minha mãe saiu, dando outro beijo molhado e me dando uma sombrinha para guardar na mochila. Sinal de que realmente só chove nessa cidade.

 

Depois que ela partiu com todas as recomendações comuns às mães, fiquei observando a cozinha. Era simples, mas muito bem decorada e cuidada. Uma estante na sala, que era visível de onde eu sentava, chamou minha atenção. Caminhei até ela e congelei de horror.

 

Aquilo era um pesadelo!

 

Uma procissão de fotos minhas, desde bebê até a do último aniversário. Vou matar meu pai! Ele tinha que mandar essas fotos para ela? Que horrível. Se eu fizesse um amigo e ele viesse me visitar, eu sumiria com aquelas fotos, com certeza.

 

Era fácil notar que minha mãe ainda não havia superado os erros do passado. Fotos do casamento com meu pai e de minha infância predominavam aquelas estantes. Era como se o tempo não tivesse passado, como se eles fossem recém casados com um filho pequeno.

 

   Mas o casal já não estava mais junto. E o filho já não era pequeno – de longe meu 1,80 m podem ser pequenos.